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Mostrando postagens de abril, 2016

Escuta, Zé Ninguém

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Escuta, Zé Ninguém, vamos deixar combinado: não te diremos nunca a verdade. Vamos te enganar todos os dias da sua vida, para o seu bem. Por que você, Zé Ninguém, não sabe mesmo lidar com a verdade. Faltam na sua mala as ferramentas básicas para lapidar a verdade e transformá-la em diamante. Então, a verdade pra você, Zé Ninguém, é só uma pedra no sapato. E nós aprendemos a lidar contigo. Regra primeira e intocável: minta. Diga ao Zé Ninguém o que ele quer ouvir. Diga que existe o mal e o bem e ele está do lado certo. Diga o confortável. Nuances incomodam. Exigem pensar. Dê ao Zé Ninguém uma bola e dois times, diga que basta ganhar e deixem-no extravasar suas muitas frustrações neste jogo. Ele berra, chuta o torcedor adversário, cospe, picha a ciclovia... Enquanto isso, se distrai e nós andamos. Segunda regra: não seja autêntico. Invista numa bela fachada e finja por algum tempo em frente às câmeras, no palanque, diga o que ele quer ouvir, nunca o que ele precisa. Não é assim, Zé Ningu

Inquebrável

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Minha autoestima é conquistada, pelejada, esculpida em alabastro, anos a fio. Minha autoestima não é fake, não é meu orgulho travestido, não é make-up do meu ego. Bate. Provoca. Minha autoestima não vai se retirar. Mesmo quando corre na espinha o calafrio imemorial do abandono, não solto mais minha mão. Não entro no jogo do desamor. Retorno a mim, ao meu farol intenso, onde trabalhei duro limpando engrenagens, lâmpadas, recuperando peças quebradas. Não me perco mais nas suas tempestades. Vejo seu Netuno colérico, surtado, surdo, esparramado sobre o palco. Cachorro ferido, impossível de ser tocado pelo amor. Repudiando com dentadas todo gesto de carinho. Retiro-me desta plateia. Saio sem alarde pelos fundos. Deixo seu espetáculo para aqueles que gozam nas suas porradas. E há muitos. Você sabe. Vivem à sua volta lambendo seu chicote e alimentando seu Deus criança que tudo quer e tudo pode.  Desfilam de torso nu para exibir os vergões avermelhados como prova de que desfrutam um lugar a

Eu, você e o Cunha de noite

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Amigo, não vou facilitar as coisas pra você assim como não foi fácil pra mim escolher um lado. Então, se não quer provocar suas crenças, pare de ler já. Estou disposta a desestabilizar nossa amizade. Estou disposta a tudo. Para começar, vamos tirar os rótulos do coldre e colocar no chão. Nenhum de nós dois é vil. Isto você sabe: é o que mantem íntegro o nosso vínculo. Fizemos escolhas e teremos que justificá-las no futuro, ou podemos esquecê-las, o que tem sido mais comum neste país. Eu gosto de você porque sei que você dirá: escolhi a justiça, a correção, a mudança, a luz. E eu acredito. Mas não gosto de você quando parece que não posso escolher o mesmo sem estar do seu lado. Nesta hora te acho apenas infantil. Não diria isto a um inimigo. Não perderia este tempo. Isto supera a política: no dia a dia sua mãe, seu namorado, sua filha, estarão certos mesmo estando do outro lado e você não estará errado. A morte da maturidade acontece quando o fluxo se interrompe entre os dois lados c

Não queira me mudar!

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Não queira me mudar. Disse o homem com firmeza. Sou quem sou. Também acho uma estupidez erguer qualquer relacionamento na expectativa de mudar o outro. O homem tem meia razão, embora eu não quisesse mudá-lo. Querer mudar o outro, para mim, está entre a absoluta falta de humildade e a total perda de tempo. Mudar o outro acontece, mas não como um propósito. Sei que serei um espelho e o homem talvez mude por vontade própria porque é natural das relações verdadeiras, transformar as pessoas. A mim, basta existir com integridade, com verdade, sem muitas querências em relação ao planeta insondável do outro.  Tive a chance de ser terapeuta e desisti. Não sou tão altruísta a ponto de me dedicar a mudar quem quer que seja. Mas tive vontade de dizer ao homem: vai mudar, criatura! Qual o problema? Pra que tanto apego ao que se é ou parece ser? Escolhemos pessoas espelho quando alguém em nós quer mudar. Escolhemos pessoas foscas quando queremos a paz da inércia. Pessoas espelhos devolvem a nós t