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Mostrando postagens de agosto, 2011

Pequenos Homens e Sua Obras

Nos acostumamos ao fedor. Pobre povo desprovido de indignação proativa. Povo manso, encabrestado. Dividimos entre nós a praga da baixa autoestima. No nosso jardim, todo mundo pode fazer coco. Olho pela janela: meu girassol cagado por um deputado, um senador, um ministro corrupto.  Dou um suspiro magoado e vou pegar minha pazinha de lixo, jogar aquela merda em outro lugar. Amanhã ou depois o nobre político virá baixar suas calças e deixar mais uma de suas obras em cima das minhas margaridas. No caminho, pisará nas delicadas sempre-vivas. E ele nem se dá mais ao trabalho de vir incógnito à noite. Porque para o filho da puta eu, meus filhos, minha casa, minha cidade, o tal público, existe para saciar seus instintos primitivos de macaco recente que são meter a mão, comer e botar pra fora. Depois de aliviado, como sempre, ele limpará o traseiro na minha apatia e seguirá feliz para o jardim do vizinho. Eu, para não passar atestado total de vaso sanitário, já que pertenço à elite intelectual

Aqui Jaz

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Hoje, de uma pedra, olhei o mar batendo no horizonte. Montão de água esparramada. Em silêncio, encarapitada na pedra, deixei o mar engolir minha cabeça. Eu tenho desde criança esse sonho: ser engolida pela natureza. Birutice. Nos momento de cansaço me controlo para não deitar na terra e me cobrir de folhas secas. Cheirar a terra feito cocaína. Eu sou tomada por estes delírios de fusão com o planeta. Só contemplá-lo, já me recodifica. Ficar olhando a copa da árvore no contra luz do sol, a dança dos galhos no vento, folhinha que despregou de lá e veio rodando forrar o chão. Pronto, o cordão umbilical entre o eu e a árvore foi reestabelecido e converso com ela sem palavras. Sim, os loucos falam com árvores e bichos e sabem que o mar está vivo, e nos observa. O mar olha a mulher de preto com sua mochila nas costas aboletada na pedra e sente saudades dela.   Sabe que está fugida do mundo civilizado e logo irá mergulhar no resort atrás de si rumo ao seu trabalho. É o que ela faz. O que faço.

Pula

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Para criar é preciso descriar. Desmanchar o sólido do cotidiano. Colocar uma bomba no café da manhã, ou uma flor. Para criar é preciso jogar fora. Gente apegada não visita as camadas profundas do criativo. Aquela grande ideia pode ser uma boia enrolada nos tornozelos. Criar é buscar a pérola na fenda abissal do oceano. Criar é expor-se, resvalar no ridículo sem pudor. Estar aberto ao ridículo. É deixar sair: o banal, o chavão, a rima pobre, a obviedade. Suportá-los. Criar é dar conta do seu ruim.  Encará-lo. Desmistificá-lo. Na mesma fila das lâmpadas queimadas está a gestalt luminosa. Criar é ter paciência com o lago estático do inconsciente. Esperar o grande peixe morder. Criar é exercício. É engrossar a musculatura da imaginação e da técnica diariamente. Provocar o universo, cutucar a mesmice porque ela está ali feito casca escondendo o novo. O mundo urge criativos. Mas o mundo roda feito liquidificador de almas numa mesma toada monótona. E rodamos juntos em baias padronizadas com a

Operária

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Sou culpada por cada linha que escrevo. Bem no fundo, debaixo de todas as capas e véus de autora que me disfarçam, esconde-se a operária que precisa carregar sacos de batata no porto ou abastecer diariamente uma caldeira com carvão para sentir-se digna. Eu carrego bem talhados em minhas costas os mandamentos do proletariado onde nasci. Bíblia do eterno sacrifício, da conquista pela dor, da necessidade do esforço, preferencialmente o físico. Ostento, feito tiara de ouro, minha coroa de espinhos de mártir trabalhadora. Gosto de reclamar em voz alta que virei a noite na labuta ou liquidei mais um final de semana em nome do ofício. Na lida do quebra-pedra sinto-me em paz, irmã dos meus próximos. Mas, se me enfio no ócio salutar às mentes criativas, se me entrego uma manhã inteira à contemplação da paisagem para dela extrair um poema, corro feito louca dali para o açoite. Eu engrosso a horda dos inimigos sutis dos orgasmos existenciais. Gente que olha a fartura com preconceito e acha que a