A vida de narciso

Pobre narciso preso no labirinto de espelhos de um parque de diversões falido. Sempre se vendo gigantesco ou minúsculo na fome do próprio reflexo. Mais um prisioneiro na caverna hipnotizado pela sombra que seu corpo projeta na parede. Incapaz de ver as flores que explodiram do caule  da buganvília, o  mosaico de nuvens que se renova todo dia no vitrô do banheiro, ocupado ad eternum com o seu eu excessivo e insuficiente. Dançando autômato em volta da sua fogueira de dores, do seu altar de vontades. Cansativo narciso em sua miopia que apaga o outro, que obriga o outro a fugir  do repetitivo espetáculo da morte à beira do lago. Pobre criança deformada pelo desamor como um tronco de árvore abraçando a grade que o cerca. Pobre narciso condenado à perene incompletude, à fome e à sede que não cessam, ao ódio àqueles que nunca o satisfazem. Buscando culpados no mundo. Cavando o chão sob os pés dos seus amores. Cultivando amantes abusáveis e foscos. Ilusoriamente rico em autoridade e poder, mas pobre, pobre, infinitamente pobre narciso em sua gaiola.

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