Sem Perder a Elegância

Me resta ajeitar a vida possível com alguma elegância. No final das contas, aprendi que é o que importa. Aquela sutil elegância preservada na trajetória acidentada, sobrevivente de tantos tombos. Está lá apesar da pele cada dia mais flácida e do excesso de peso que assumi perene. Uma calma diante da tragédia repetitiva que teima em voltar para a vida esfolada do pequeno cidadão brasileiro. Povo acostumado a quebrar a própria cara. Eu e a mania masoquista de estudar história. Mas esta condição de nascimento não me fará perdê-la: a sutil elegância, o delicado charme na dor. É o que me resta e devo cultivá-la. Nada de gritos, ataques de fúria, nada de revoltas que desalinham os cabelos. Não sou amadora na frustração, sou brasileira. Pego minha flauta e me junto à orquestra do Titanic e tocamos enquanto parece afundar eternamente. Moramos na distopia, nem sabemos o que é ter chão. Mas não importa. Preservo no rosto, com uma dedicação monástica, a expressão blasé dos desencantados. Às vezes, comento nas redes sociais a tragédia do dia e ensaio um sorriso nervoso... mas logo estou de volta à nossa sagrada anomia. Dançando com passinhos curtos e a bola de ferro presa ao tornozelo. Com tanta elegância que até pareço gente.

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