HARARI, O INÚTIL
O historiador me contou no seu livro: a história dá ré. Não
sei de onde eu tirei a ilusão de que a humanidade avançava numa linda e
indefectível espiral rumo ao infinito. A história dá ré, como se fosse apagada
da memória coletiva humana, como se as páginas dos livros onde ela morava
fossem lentamente evanescendo até o vazio total. E então, fosse necessário viver tudo de novo,
capotar na mesma curva, bater o joelho na mesma quina, entrar na mesma rua sem
saída. E a história, então, se repete,
como um cacoete neurótico, uma necessidade doentia de lavar as mãos,
checar as trancas das portas, ou fazer qualquer outro gesto inútil, vago,
estéril. E de nada serve existirem o historiador, seu livro e seu conhecimento
super-humano. Nada será capaz de calçar o carro da humanidade em sua sanha de
despencar ladeira abaixo. Lá dentro, o povo retroage com os olhos vidrados lá
na frente. Voltam, crentes que avançam. Voltam porque, na pressa de avançar,
descuidaram da memória que se perdeu. Voltam pra escrevê-la, desta vez na pele
com canivete pra ver se não tornam a esquecer. Sangra, dói... Mas com o tempo a
cicatriz se deforma, e a palavra que escreveram ali feito tatuagem não está
mais tão legível... “Ditadura nunca m...”. O tempo segue suavizando a cicatriz
até que alguém se auto intitula capaz de decifrá-la e vocifera: “Ditadura nunca
matou ninguém”, foi isso que escrevemos! E, bingo, agarramos todos na alavanca
de marcha e engatamos, em êxtase, a ré.
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