Intersecção
Ontem não era você, cara, que gritava por tolerância? Que
denunciava a agressividade vazia movida pela frustração? Não foi você que
alimentou sua rede com posts lindos falando da necessidade de se colocar no
lugar do outro? Do diferente? Não era você a vítima dos que atiram primeiro e
perguntam depois? Não era você o grande arauto das publicações contra o
preconceito? Sabe o que é preconceito, cara? Preconceito é rotular sem escutar.
Preconceito é colocar todos os gatos: pardos, brancos, pretos, no mesmo saco só
porque você é cachorro. Preconceito é achar que a sua régua é a única que
existe e tudo tem que caber nela. Preconceito é enxergar em preto ou branco,
sem tons de cinza. É eximir-se de praticar a compaixão porque segundo mensagens
dos seus pares no whatsapp o outro é mal. É rotular os que não se encaixam no
seu extremo de covardes, traidores. O teste maior dos valores é ter um inimigo
no poder. Se então nossos valores se deformam, se a mágoa nos cega, se nos
tornamos os defensores do vale tudo contra o mal, nos colocamos no lugar dele, do
inimigo. Não da forma saudável, transformadora, que chamamos compaixão, mas
como uma outra roupa na mesma triste figura. Aquele que ontem era o carrasco,
sempre esteve cheio de ótimas justificativas e lindas crenças: a lente através
da qual ele vê o mundo. Mais do que óculos: são os únicos olhos que ele tem e
não iremos arrancá-los como não irão arrancar os seus. O que resta, cara, é caminhar para perto da cerca,
escutar o outro em sua complexidade, em sua contradição, e buscar intersecções. Só críticas, não vale, é pouco: intersecções. Elas serão hoje e amanhã o único caminho possível, seja quem for que
esteja sentado no pinico do poder. O resto é vomitar a raiva, é a sempiterna humana ilusão de
exterminar quem incomoda. E já tentaram. E é só ilusão, cara.
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Para o cara e para minha amiga Ivana Mihanovich que chuta o banquinho das minhas certezas.
Para o cara e para minha amiga Ivana Mihanovich que chuta o banquinho das minhas certezas.
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Faz tanto tempo que não leio... porque não encontro nada que toque meu coração. Mas seus textos me tocam o coração.
ResponderExcluirÉ como uma identificação, uma empatia... ela sente o mesmo que eu, mas ela expressa em palavras e eu em silêncio. Como se no meio de muita gente, enfim encontrei alguém que sente o que eu sinto.
Conheci um texto seu através de um vídeo compartilhado no face... e então busquei saber mais do seu trabalho.
Caí aqui...
Oi Lúcio, fico muito feliz e honrada com seu comentário. Vamos seguir juntos. Publico sempre lá no Face e algumas vezes aqui quando é texto novo. Forte abraço.
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