Sem música

Nada a fazer. Não sei ser esta pessoa inerte. Ficar parada, quieta, sem arrumar nada, sem varrer, costurar, ler, escrever, ligar a tela do celular... Nada. Não sei. Invento coisas pra encher minha cabeça completamente apavorada por este hiato sem movimento, sem gestos, sem palavras, sem propósito, sem conteúdo. Apavorada de me pegar assim: completamente inútil na ciranda do cosmos. O mundão lá fora rodando alheio ao meu silêncio imóvel. O mundão rodando antes e depois de mim. Então corro para o teclado e vou escrever, minha fuga conhecida. Escrevo para provar a mim mesma que existo, que importo. Alguém um dia precisará ler este texto e eu o terei escrito, invento. Bobagem. Devia ter ficado quieta e suportado o vazio mais um pouco. Deixado a ansiedade me comer até passar. E seguir para além dela... O que existe para além da minha voraz necessidade de agir, de consumir, de compartilhar? Não sei. Não sustento o corpo boiando no mar por mais de alguns segundos. Não deixo o nada me engolir. Não atravesso para o outro lado do existir onde talvez o meu próprio colo me espere. Enfio compulsivamente coisas no meu nada. Encho minha mente com uma sequência infinita de vídeos que empurro com o dedo enquanto pressinto estar perdendo, a cada segundo, uma porta para a paz. Sou um corpo hiper estimulado, viciado,  no carnaval sem pausa dos sentidos: reagindo, produzindo, processando, indo. Como se a pausa fosse a morte. A pausa essencial sem a qual a música não existe.

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