O que Piora o Mal

Obrigada, Senhor, por não me serem dados poderes divinos. Por não me ser dado o dom de fazer pessoas explodirem. Hoje, eu teria feito merda. Teria sumido com milhões de brasileiros. Não tenho mais paciência para gente que, no Brasil de 2020, xinga alguém que está de máscara higiênica na rua de comunista. Não suporto mais quem ostenta essa burrice com o furor de quem tivesse sido indicado ao prêmio Nobel. E não é só a burrice de nada saber sobre a história e o comunismo e o vírus que me incita ao ódio: é a prepotência de ser estúpido com orgulho. Muitos brasileiros, nefastamente, se portam como ignorantes orgulhosos. São tão ignorantes que não sabem que são, tão xucros que ajeitam a própria peia no pescoço pra combinar com a camisa. Conheço vários. Batem no peito e arrotam teorias sem sentido sobre tudo. Sabem de tudo mais do que qualquer especialista que tenha se debruçado metade da vida sobre o tema. Gênios de mesa de boteco, repetem feito papagaios qualquer conteúdo mal ajambrado que outro inútil se deu ao trabalho de lapidar pra fazer parecer realidade. Têm absoluta fé de que a verdade suprema do dia pipocou no seu celular enviada por um outro gênio que frequenta a mesma sauna que ele. Verdade esta que o "Einstein", muitas vezes um sujeito ou sujeita que gastou uma vaga numa universidade, não se deu ao trabalho de checar. E passa a cretinice pra frente, de cabeça erguida e com aquele sorriso de empáfia das criaturas que se sabem desinteressantes. E eu, em geral, tenho compaixão. Quase sempre penso que é uma vítima do sistema que, de alguma forma, o privou de conhecer porque precisa dele para puxar a carroça da história. E que, no fundo, ele sabe. Por isso decidiu declarar alto e publicamente seu desprezo pelo conhecimento. Mas hoje, quando um ser destes cruzou com um amigo de mais de sessenta anos, usando uma máscara higiênica, numa avenida famosa de São Paulo, e o chamou de comunista alarmista... morreu em mim qualquer possibilidade de tolerância. Vírus matam menos sem o auxilio luxuoso de gente estúpida e temos uma manada de ignorantes opcionais no Brasil. E são eles, e não os idosos, que nos colocam em risco. Gente que tem grana pra comprar fardos de saber e estocar no cérebro e não faz porque alimenta com a mamadeira da preguiça o vírus de estimação da burrice gourmet. Gente que influencia os que não têm acesso à educação e gera este circuito infinito de atraso. E eu fui contaminada. Confesso que meu organismo não suportou e foi infectado por uma estupidez reversa e hoje desejei simplesmente que eles morram. Morram. Agora, com licença, que vou me confinar num livro tentando recobrar minha saudável humanidade. Esqueçam este texto. Não se contaminem. 
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Da Senhorita Safo para o Fabio Maillet que teve o azar de encontrar uma anta na Paulista.

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