Onde você está, amor?

Raras vezes perguntei a ele “onde você está”. É uma pergunta que me incomoda. Tenho dificuldade  em compreender o seu propósito. Talvez queira saber onde ele está porque preciso de pão e quero entender se ele está próximo a uma padaria... Neste caso, prefiro perguntar: você poderia trazer pão? Talvez tenha havido um desabamento, um desastre natural, e eu queira saber se ele está seguro. Neste caso então, pergunto apenas: está tudo bem? Não consigo pensar na pergunta “onde você está” sem sentir nela um ranço de controle. Informar ao outro onde estou, onde vou, onde fui, sempre levanta em mim suspeitas de uma negociação entre controladores. E quando percebo que uma pergunta serve à minha necessidade de controlar o outro, perco imediatamente a vontade de fazê-la. Acho toda proposta de controle estúpida , simplesmente porque resulta inútil. Não há controle de fato e seria mais saudável para todos simplesmente aceitarmos isto. Sairmos da janela e abraçarmos a criança desesperada lá dentro que tem medo. Não tentar prender o outro com cadeados disfarçados de amor. Cadeados nada podem no amor. Perguntas como esta buscam apenas uma resposta confortável, uma anestesia temporária. Tantas pessoas se bastam no conforto temporário de uma resposta anestésica. Tanta gente pergunta “onde você está”. Tão raro perguntarmos: “o que você sente?” Esta sim uma pergunta perigosa para os iludidos controladores. O outro pode estar infeliz, por exemplo. Mas não importa, desde que ele esteja infeliz dentro da minha cerquinha, ao alcance dos meus olhos, num lugar que eu saiba. Pior: o outro pode estar feliz onde não estou. Não tolero: melhor infeliz cantando na minha gaiola. “Onde você está” é “onde eu não estou”. Não pergunto. Sei que ele volta porque aqui é bom. Sei que aqui é bom. É onde estou. Uso meu tempo fazendo aqui ser melhor... ainda que ele não volte. 



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