O flamingo e o guarda-chuva
No quarto fantasma, o ventilador de teto faz um ruído
monótono de pás cortando o vento, a chuva tamborila na telha lá fora e minha
mente-câmera novamente confere ao todo esta qualidade de filme. Paredes brancas
estranhas do meu quarto das quais sempre desconfio. Boio, deitada na cama, num
cenário surreal que insisto em desconhecer: minha casa. Tantas casas tive. Tantos
quartos estranhos vivendo na memória. Eu sempre lá: flutuando uns centímetros
acima do colchão e vendo os móveis virarem fotografia. Tentando com força
voltar para o corpo, encaixar na matéria, no berço de fumaça. Vivendo com as unhas fincadas na cama: uma forma estúpida de viver. No quarto fantasma, na realidade que não me
convence, sentindo o perfume de outras dimensões, talvez louca de pedra, boio acima do colchão duvidando da existência do ventilador. Eu: ser mal encarnado, mal ancorado ao
corpo, mal iludido, fingido. Um
guarda-chuva rosado no meio de um bando de flamingos. Tentando mimetizar as aves e imprimir-me na foto sem alarde. Sentindo-me foto, não gente.
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