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Mostrando postagens de janeiro, 2014

Leva meu medo, filha

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Filha leva meu medo que tá frio, que tá escuro, leva meu medo que você é pequena e o mundo é mal. Filha leva o casaquinho e o medo do meu olhar. Minha boca te diz vai, mas ouve de fato os meus olhos. A pupila dilatada acima do meu sorriso falso que diz: você não dá conta. Leva o meu medo, filha, e faz ele virar seu. Este texto agora pode ser lido na íntegra no novo livro da Senhorita Safo.  Disponível a partir de 12/03/2016 no site das melhores livrarias.

O Estupro - Última Parte

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Autor Desconhecido (continuação do post anterior) A brecha na represa rápida abria seus lábios. A borboleta do amor pousa onde não se imagina. Os braços do homem em cruz comprimindo suas costas, a boca presa à sua, a enlouquecedora fricção das peles, rasgaram em definitivo a barragem do medo e trouxeram do fundo escuro do rio uma explosão de energia.  A onda de prazer avançou sobre o corpo de Cecília feito tsunami encharcando cada célula. Instintivamente, ela se agarrou ao estranho como a uma âncora. Seu grito espatifou-se nas paredes e um coração bateu louco em cada ouvido.                            Pouco depois um gemido, o corpo dele estremeceu sobre o dela, e estava feito. O líquido quente espalhou-se, lançou espermatozoides no espaço, avançou pelas trompas, molhou o rosto do útero, lavou a alma, fecundou o inconsciente, engravidou o futuro. O corpo dele sobre o dela tornou-se subitamente frágil. Os músculos reagindo em espasmos pequenos e dispersos, estertores d

O Estupro - Penúltima Parte

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(continuação do post anterior) Pausa. Aqui é preciso contar que Maria Cecília teve muitos homens e, desde o primeiro, todos ela seduziu. Às vezes sem saber que seduzia, às vezes despudoradamente, como uma prostituta a trabalho. Muitos quiseram guardá-la, desde o primeiro, desde o pai. Mas Cecília escapou sempre entre os dedos que apertaram. A sedução era seu vício e sua jaula. Vendia-se compulsivamente aos homens, nunca se entregava. Ao lado do pai amargurado e do ator de teatro aos prantos, tantos outros remendando seus cacos depois que ela partia. Talvez eu esteja até sendo injusta. Talvez mulher nenhuma nesse mundo mereça um estupro. Mas, lá no fundo, insiste a ideia de que não havia mesmo outra forma de profundamente tê-la. Porém, é fácil filosofar com a crueldade dos autores que sempre se salvam quando é ela que está sendo violentada e não eu. Submetida pela força, restou a Maria Cecília gritar palavrões imundos contra o desconhecido. A cada estocada violenta, ela reagia

O Estupro - Parte III

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Foto Edgar Neumann (continuação do post anterior) No fundo do escuro da inconsciência havia uma porta imensa aberta dando para uma sala iluminada. Encostada no batente, Cecília via a pequena Maria Cecília. Lá dentro, debaixo da ducha de água do chuveiro, estava ele. A porta sempre esquecida aberta. O corpo ensaboado, dançando no meio da fumaça branca. As mãos deslizando sobre a espuma do corpo. Displicentemente o pai ensinava à filha os caminhos do desejo. A penetração foi lenta e cuidadosa. Quando acordou, Cecília tinha o homem deitado sobre si, imóvel. Sentiu enterrado entre as suas pernas, vivo, quente, pulsando, o sexo dele. Suas barrigas encostadas respiravam num só ritmo. Um diafragma empurrava o outro que relaxava sem luta. O homem inerte, mudo, largado sobre seu corpo, preso a ela por um pedaço quente de carne.  Maria Cecília descobriu que nada podia incomodá-la mais do que aquilo que não entendia. Preferia a violência convencional do estupro ao desconhecido, i