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Mostrando postagens de janeiro, 2020

Devorem-se a si mesmos

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No alto da Terra Brasilis, no meu coração e ao meu lado, duas palavras,  permissividade e tolerância, se debatem. Se combatem e se confundem nos corações cheios de ódio do meu povo. Porque fomos e somos permissivos. Porque toleramos o intolerável. É histórico. Toleramos violências, abusos, demais. Assim a tolerância deixa de ser civilizatória e torna-se permissividade barbarizante. Deixamos falar, deixamos roubar, deixamos bater e o elástico já foi esticado demais. Deformou-se. Perdemos a noção do inegociável. Desta dor, tristemente, nasceram carrascos da tolerância cheios de razão. E qualquer negociação com o lado de lá tornou-se criminosa. E qualquer palavra do inimigo tornou-se veneno. Tudo virou duelo e estamos autorizados pela mágoa a atirar primeiro ou atirar o mais rápido possível. Refletir virou luxo dentro da trincheira. E nós (todos nós) que fomos e somos permissivos historicamente com abusadores, estamos autorizados enquanto vítimas a alguma intolerância com o diferente.

Filhos

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Foto Andrea Pasquini Os filhos chegam ao mundo com suas malas. Dentro delas muito mais do que a genética pode nos ajudar a prever. Filhos carregam uma história que não nos pertence. E é dolorosa esta impotência de ser mãe ou pai. Difícil abrir mão da ilusão de que podemos salvá-los sempre. Não podemos. A eles cabe salvarem-se no final das contas. Podemos ensiná-los a nadar, mas não há garantias de que não se afoguem. E ganhamos muitas ferramentas para medi-los, pesá-los, sondá-los, escaneá-los, o que aumentou nossa responsabilidade sobre suas naturais deficiências. Se algo neles falta, torna-se eterna responsabilidade nossa saneá-los. E neles falta muito. Mancam, sofrem, se desesperam, não dormem, não comem, não querem ir à escola. Filhos são a fronteira final da nossa ilusão de controle. Eles capengam e nós nos debatemos com a conclusão de que não somos deuses. Fazemos o melhor e ainda falta porque a resposta não está em nós. Somos só companheiros deste trecho da viagem. No antes

Laudemira

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Sob a chuva, caminhando, sou minha vó índia Minha vó e suas longas tranças Minha vó árvore, minha vó casa de barro Minha vó canoa no rio, minha vó pé no chão Minha vó bonequinha de pano Sou a chuva, a poça barrenta, o rio cheio Sob a chuva, caminhando, sou a natureza inteira Sou minha vó bicho cheirando a terra Virando a terra e renascendo broto  Que o céu me batize e me abençoe Que o céu me lave como boa mãe Que o céu me ague feito semente Que o céu não me deixe esquecer que somos um só Eu, a chuva, o tempo, tudo que não sei E minha Vó.