Meu filho, o cliente

No restaurante, o jovem está sentado em frente à mãe com ar de tédio e olhos perdidos na tela de vidro do celular: absorto num papo de whatsapp elíptico e infinito. A progenitora se esforça em parecer interessante. Faz uma pergunta estúpida sobre o dia, os estudos, algum amigo, algum amor... O jovem retorce a boca num muxoxo cheio de enfado e responde com monossílabos sufocantes e aquela aura de superioridade blasé. Não soubesse que se trata de um filho e sua mãe e acreditaria tratar-se de um faraó egípcio sendo assediado pelo cotidiano desinteressante de uma serva. Eu, sentada na mesa ao lado, sinto o fígado latejar em espasmos biliares. Penso em me levantar num susto e dar um tapa coreográfico no telefone com força suficiente para que voe sobre as mesas indo se estilhaçar contra a parede mais próxima. Agarro com os dedos a xicrinha de café que há de manter-me como uma âncora resignada em minha mesa. Realizo que estou absolutamente identificada com aquela máquina de parir e cuidar que já desistiu de concorrer com smartphones de última geração. Afinal, tenho 2 filhos jovens. A mãe está olhando muda e perplexa e invisível para um ser a quem, ela entende, deu tudo que conseguiu dar e tudo se converteu numa imensa falta de empatia. Ele,  encantado por seus próprios desejos e dores e projetos e frustrações, simplesmente, não a enxerga. E ela pensa que deve ter resolvido demais, sido motorista demais,  pago contas demais,  cursos demais,  dado presentes demais e dito poucos "nãos" e agora é tarde. Ela não se humanizou aos olhos do filho. Agora é só a máquina de refrigerante que não precisa de ficha. Pior: ela é chata, ela só reclama, ela se repete em cobranças inúteis: quer o prato lavado, beijo de boa noite, quer notícias do dia, quer que ele responda as mensagens pra poder dormir... E, murchando no  silêncio daquela mesa, ela pensa que é culpada de não ter sido menos e exigido mais. Agora quer uma parceria mínima e tem um cliente insatisfeito.  Ameaço levantar e dar nela um abraço, oferecer um ombro, uma qualquer cumplicidade. Engulo o resto do café e vou embora... pensando que o futuro da humanidade está nas mãos deles, dos clientes insatisfeitos no planeta restaurante a quem, desafortunadamente, não ensinamos a servir.
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