Devir
A deusa arrancou-me o cabresto da cara, sem piedade. Eu, que
ainda me agarrava a uns farrapos de certeza. Entrou imperiosa na minha tarde
monótona e cortou as amarras dos meus arreios. E atirou minha auto piedade para
o invisível. Acabou, ela disse. Nada mais de comprar expectativa pra alimentar
queixa. Levanta e calça no pé as encruzilhadas, a vida agora é devir. É acordar e entrar no
rio, e sair sempre em outro lugar. Sem esperança de porto, sem medo de
barranco. Acordar rio. Acabou, ela disse, o susto, as assombrações sob a cama, o
mal à espreita, a dor de estimação. Agora, minha filha, a vida é devir. Acabou
a morte, não tem mais perde e ganha. Tudo está perdido porque nada é seu. A
deusa deu as costas, sem alarde, e mergulhou no meu peito. Acabou o drama,
reforçou na profundidade da ausência: levanta e se veste de labirinto, e dança:
a vida agora é devir.
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Lindo Nanna,a vida é mesmo um eterno devir,nos que não gostamos de ver e nos agarramos aos carretos.Segue sua luta.
ResponderExcluirBeijos
Vera
Não são carretos,são cabrestos
ResponderExcluirAchei lindoooooo
ResponderExcluirObrigadaaa
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