O Sabiá e a Pitanga

Veio a ventania e levou a menina. O vento abraçou, tirou do chão e levou rodopiando no céu feito uma valsa. Assim me contou um passarinho que viu. Quando cheguei, já ia longe, uma manchinha colorida no céu. A menina nos braços do vento. E eu, que tinha ido me buscar nalgum canto, quando voltei, outro pedaço de mim havia partido. Feito um dente de leão cheio de histórias, a alma da menina foi se replantar em outro plano. No começo, gritava ao vento que a devolvesse. E tive raiva dos dois porque sabia que ela havia consentido na dança. Magrinha que era, bem podia ter se agarrado em qualquer trem. Nada. Deu os braços pra ventania, passarinho me disse. Aqui nesse planeta, achava que os pés queimavam no concreto. Com o tempo, o chão esfria, eu falava no ouvido dela. Te levo um pouco no colo. Não quis.  Partiu, súbita, feito bexiga de gás escapulida da mão de criança. Pediu ao sabiá que me visitasse de vez em quando, mas de forma que ficasse explícita a presença dela. Passarinho se esforçou. Um dia, no parque, me encarou com uma pitanga no bico e, minutos depois, soltou lá do alto a semente direto na minha mão. Avisado pela menina sobre a cabeça dura da mãe, voltou outro dia, invadiu minha casa e deixou outra semente de pitanga na sala. Esta última, eu plantei. Semente morta vai virar árvore, vai virar um pé de menina abraçado ao planeta, raízes bem fundas na terra pra ventania apenas passar, acalentar os frutos, fazer cócegas nos galhos e seguir vida adiante. 

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A história do sabiá que me traz sementes de pitanga é verdadeira. Fantástica como a vida para quem está disponível para ver. 

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