A lama nossa de cada dia
A lama
Novamente a lama
Mais uma vez a lama
A cena se repete exaustivamente como um episódio
neurótico
Como uma esfinge que perguntasse infinitas vezes a
mesma pergunta
E a quem respondêssemos exaustivamente a resposta
errada
A lama
Novamente a lama
Mais uma vez a lama
Como um outdoor de beira de estrada cheio de
corpos
Que se repete a cada cem quilômetros
Incomodo profundo, mas breve. A cada cem
quilômetros, garantido, um novo susto
A lama
Novamente a lama
Mais uma vez a lama
Não é terremoto, não é incêndio, nem furacão,
percebe?
É a lama e sua tradução urgente
E esfinges não desistem das respostas
E neuroses não desistem da cura
E ela não desistirá de nós
A lama
Novamente a lama
Mais uma vez a lama
Não é Macacos, Miraí, Mariana, Brumadinho
É a barragem dentro do homem mal construída pra
conter o egoísmo
Não é um paredão num rio de Minas que se rompe
É a boca aberta de poderosos sem luz
Vomitando desamor sobre gente que nada vale
A lama
Novamente a lama
Mais uma vez a lama
Esperando a resposta que for barragem verdadeira
Esperando que parem de acelerar na mesma estrada
Esperando cuidadosamente guardada dentro desta nossa permissividade
enlameada.
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