Tatiane
Na internet circulam, fartamente disponíveis, imagens de
Tatiane, 29 anos, sendo espancada na rua, no elevador, nos corredores, no dia
em que seria lançada pelo marido da sacada do seu prédio. Esboça uma fuga, não consegue, volta para os braços do carrasco. Tenta fugir muitas outras vezes mas é tarde. Ele a arrasta, frágil, débil, como uma boneca
de trapos. Revejo a vítima conhecida que um dia, submetida pela necessidade de ser amada,
completada, de não estar só, ficou tempo demais. A fuga não é mais possível e a morte virá logo.
Revejo um lugar onde já estive de forma bem menos dramática. Não apanhei e
estou viva. Mas sei o que é negociar o inegociável para estar com o outro.
Aquele vazio assustador quando ele se vai batendo a porta, muito mais
intolerável que os abusos, os surtos de agressividade infundada, os abandonos
recorrentes quando o olhar se perde nas outras como se inexistíssemos, as
depreciações em público travestidas de humor. Sim, eu já fui abusada em alguns destes sentidos sutis que simplesmente não sabia que eram abuso. Só o que me separa de Tatiane
é a intensidade, e o fato de que fui chaqualhada pelo autoconhecimento e me vi
entregando a mim mesma ao carrasco muito tempo antes que ele fosse longe demais. E ainda era possível fugir. E disse
“não” num grito poderoso que me acordou. Mas sei que muitas outras meninas irão longe demais. Negociando perigosamente pequenas violências em nome de um supostamente essencial companheiro. Um supostamente salvador amor. Calando ou amenizando as provas de agressividade até que... Meu Deus, há tantas formas de ser morta numa relação. Mas Tatiane não está morta, vive aqui dentro de mim. Frágil, indefesa, impotente... e guardada obstinadamente por uma amazona que nunca dorme, chamada
autoestima.
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