O bicho que mora em mim

Um dia, andando no parque, achei um filhote de cachorro. Fêmea. Eu era jovem, morava sozinha, tinha um emprego promissor. Tentei dar o bicho pra alguém. Não consegui. Botei então numa caixa e levei pra agência de propaganda onde trabalhava como medida paliativa e desesperada. Ela zanzou entre pernas, passeou pelas baias, e até sobre o teclado de um amigo diretor de arte numa farra que durou uns dias. Mas logo foi preciso deixá-la em casa sozinha: a pequena cachorra de veludo preto. O coração é sagaz, espalha armadilhas nos caminhos e precisamos estar atentos. Eu tinha um ótimo emprego, um carro zero, viajava para o exterior nas férias: tudo em ordem, tudo sob controle. Até o pequeno bicho preto aparecer. Não pude conviver com a ideia de deixá-lo só o dia inteiro. Impus-me a maratona de encarar uma distância considerável e almoçar em casa todos os dias. Para ver Nina, para coçar sua barriga, para vê-la sorrir com os olhos. Não me apercebi que a alma já lançava, sorrateira, suas ram...