Oco

Estou branca como a folha virtual à minha frente. Desde domingo chamando, e o texto não vem. Espero em vão a poeta que está entocada em algum buraco do profundo. Saiu pra comprar cigarro, picou a mula. Ela que é livre e tem lá suas razões para se afastar de mim. Eu que nem sempre a amo incondicionalmente como devia. Já é quarta-feira. Melhor me entregar. Escrever sobre o nada, o buraco negro, a ausência. O nada que às vezes me apavora. Medo de olhar o meu vazio. Tudo que eu quis e quiseram de mim e não é. O que não serei, não tenho para dar, não consigo. É o que faço agora debruçada na cisterna seca. Lá embaixo, só o breu mudo. Nem tristeza vejo. Só um oco. Deve ser nesta hora que alguns se atiram da janela. Quando nem a dor te prega neste mundo. Mas eu não. Intuo que algo está sendo gestado no escuro e me acomodo no vácuo. E curto o vácuo, o precioso não ser. Espero. É uma espécie de meditação imposta pelo universo. Um entreato entre ser esta e a que virá. ...