INSUPORTÁVEL
Tenho procurado suportar pessoas no Facebook. Preciso delas para não perder a noção do mundo. Outro dia, sem querer, uma postagem minha ficou pública. Era sobre política. Não deu cinco minutos e alguém estava me desancando pelo que escrevi. Levei um choque. De onde saiu aquela criatura? Através de que fresta desguardada ela havia se metido no meu reino maravilhoso e perfeito das certezas do Facebook? Como aquele idiota, sem classe, sem nível, sem noção havia conseguido a chave do meu bunker? Onde vivo cercada de amigos que, vá lá, estão mais à esquerda, mais à direita, mas caminham dentro dos limites suportáveis da minha visão de mundo. De onde brotou aquela excrescência xiita? Aquilo não podia haver na realidade. A simples existência daquele idiota colocou um tremor desestabilizante no meu espaço virtual. Fiquei perplexa como se estivesse caminhando pela Paulista e tomasse um murro por estar usando uma camiseta de arco-íris. Rapidamente mudei o status da postagem para amigos. Amigos, amigos, amigos! E voltei a ficar a salvo. Apaguei os comentários do pústula e deixei tudo limpinho e não ameaçador. Voltei à minha paz. Mas este não é o mundo: grita uma consciência insuportável debaixo das minhas costelas. Isto é só a minha ilha. O mundo pra valer está inundado por intolerantes agressivos de todas as classes e cores. Políticos intolerantes com gays. Gays intolerantes com políticos. Negros intolerantes com latinos. Latinos intolerantes com negros. E o pior, berra a desgraçada consciência: não há como salvar só a minha ilha. Vamos afundar juntos, eu e o pústula, abraçados, com as unhas cravadas nas costas um do outro. Ah, se eu pudesse eliminá-lo! Mas não posso. Não é gente, é uma crença viva, ambulante. E crenças não morrem a bala. Crenças, às vezes, se desmancham com a compaixão, o diálogo, o amor. E eu sequer consegui suportá-lo.
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Um "amigo" das redes sociais me criticou quando falei mal do protesto da panelada... Disse que estava lá e que era um cidadão e que pagava suas contas e blá blá blá, como se eu estivesse atacando a sua integridade moral. Pra não render respondi: você estava batendo panela na minha janela e não veio tomar um café pra gente se conhecer? Ah não admito!" Nada como usar o humor para quebrar um ataque que podia terminar numa discussão interminável e resultar na "inimizade" facebookiana...
ResponderExcluirIsso Rafael, mil vezes o bom humor!
ExcluirPerfeito! Impressionante a intolerância. o pequeno ditador interno está mandando em muita gente!
ResponderExcluirMe assusta mas vou acendendo as luzes que posso.
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